sábado, 29 de janeiro de 2011

O Xangô de Baker Street


Ele se divertira silenciosamente com a reação indignada das pessoas diante das poucas linhas de um poema. como é pequena a alma humana. Então não percebem que Maldoror, como ele, nasceu perverso? Chocam-se com a maldade circunscrita à imaginação de um poeta obscuro, no entanto não se comovem com a crueldade que vêem estampada na cidade quando passeiam, alegres, pelas ruelas imundas. O que dirão se souberem que estão na mesma sala com um ser muito mais cruel do que qualquer criação dos livros? provavelmente, se recusarão a acreditar, desviando os olhos, como fazem ao tropeçar nos negros e mendigos sujos que encontram no caminho. Se a paisagem é terrível, feche-se a janela. Para ele, é diferente. Ele se alimenta dessa miséria cotidiana. a desgraça alheia é sempre um balsamo espesso para a sua solidão. O inferno alheio é o seu paraíso. Ele acha graça nos sermões dos padres que sempre sobrepõem o Bem do Mal, como se ambos não fossem as duas faces da mesma pataca. Para ele, o Bem é o Mal. A crueldade, afinal, não passa de um ponto de vista. Chamam de crueldade o que ele faz as putas. porque? Não é diferente do que acaba de ler, buscando inspiração, num manual sobre o trinchar. pega novamente o fascículo pousado a cabeceira e lê os trechos marcados, sussurrando como se fosse uma prece. "Tira-se primeiro a pele. o peito, depois de se lhe tirar as cartilagens, se corta pelas costelas, tomando os lugares que não resistem a faca .. corta-se então a cabeça que se oferece inteira .. o fígado e os rins também serão divididos em pequenos pedaços, para se apresentar aos que gostarem deles .. verifique-se, sempre, o fio da faca de trinchar .."
Ele fecha o livrete e coloca-o cuidadosamente sobre a mesa. em nenhum momento, chamam a este ritual, de crueldade. não é cruel, apenas porque os ANIMAIS IMOLADOS servem de alimento. É esta, portanto, a diferença. COMER. talvez também ele devesse comer. provar, finalmente, a carne das vitimas. a ideia dexa-lhe a boca cheia de saliva. ele pega a adaga afiada e mergulha na noite para saciar seu novo apetite.

(Jô)

Nenhum comentário:

Postar um comentário